quinta-feira

pela rua

ah, antes fosse fulana
uma guimba
uma pena de pardal
buzina de carro
granito de asfalto
uma nota fiscal
da padaria
(mas agora, fulana é!)

(Ah, se fulana
dormitasse nos meus ombros
e, distraída, caísse
enquanto corro no vento
com todo seu peso
de estrela morta.
Que sua polpa azedasse
e tombasse na relva,
rolasse à poeira
como chapéu surrado.
Não! Que aos pouquinhos
fosse amarelando
e serenamente pousasse
como folha de outono.)

o mendigo me pede moedinha
(seria mal de amor?)

no bar me interpelam:
(sempre a mesma empunhada)
- Hoje veio de táxi?
- A pé, Gigante.
- Você sócaminha.

cúmplices do absurdo,
(no fundo, nada absurdo)
sorrimos.

sexta-feira

sentido

vida tão mágica
não vejo direito
(a causa e o efeito
é o nosso defeito
de fábrica)

segunda-feira

dia a dia

resta um exílio hediondo
que eu transpiro e que tantos
transpiram também

resta uma triste pintura
dessa obscena dentadura
que não poupa ninguém

e nosso sorriso
desbota num canto
de notas sem vida

(afora isso, em meu quarto
restam brincos e odores
de um bem-querer que partiu)

que mandem notícias
daqueles passantes
que não sucumbiram

(e se muito não for
que mandem notícias
daquela menina)