domingo

Hora de dormir

Só restou a cauda da noite.
Então me deito
naquele azul-marinho
das primeiras horas,
confundindo as sombras do vinho
com as do leito.
Quando a fresca manhã
penetra nos poros
a terra ainda está oca.
A respiração lá fora
nada empurra.
O silêncio da janela
é cândida vigilância.
A luz vai jorrando
e nessa hora
o mesmo sol, que logo assola
e me aborrece
vejam só...
vai penetrando envergonhado,
revelando cortinas de pó;
e no seu ensaio calado,
oferece um prisma
que consola.

Os sofrimentos de X na era Y

I

Comecei por revirar
o teu quarto queimado
por tantos sinais.
Foi fácil encontrar
meu clichê lapidado
por ondas digitais!

Conectando circuitos
em delírios estéticos
(que logo resolvem atiçar meus medos...)
fico chocado por muitos
daqueles momentos patéticos
a revisar enredos.

II


as letras da boca
eram regras pra medir os lábios
a cada intervalo de tempo

os suspiros diurnos
eram recortes amontoados
de jornais amarelados

os atalhos secretos
eram páginas quentes
de um sonho noir

os filamentos da face
com poucas certezas
bruxuleantes

e a madrugada das baratas
você esmagou
civilizadamente

Operários

Ocultos estão os planetas
que abrigam finas imagens
e obrigam a narrativa
a rastejar como cobra
no trânsito dos sonhos,
no universo desafinado
de certezas virginais.

Nessa
- de juntar a porca com o parafuso
- de peneirar palavras e usos
se vai o dia.
O tráfico de interpretações
não reparte e nem dissolve
qualquer agonia.

Ao trabalho imperfeito
resta um sorriso encardido.
O dia seguinte
é comédia anunciada:
ver um cão correr ofegante
atrás do próprio rabo.